Da nebulosidade inicial, o Homem limpa os olhos, descobre o silêncio, caminha para o dia em direção à luz. O sagrado não se oculta, está em si, nele, no Homem, à procura da claridade que decorre por entre as mãos.
Do obscuro saber, o mito esmaga a exterioridade, leva o Homem à viagem interior, onde as cores revelam a presença do sagrado que se esmagam no encontro da sensibilidade, no ventre.
Da coisificação absurda, rodeante, o Homem projeta no universo, na tela, a desordem onírica, que espera, necessita, do olho, da água, da lágrima que dá ordem, sentido.
Na inquietude individual, o artista, o pintor, olha o mito, agarra a cabeça, mergulha nas cores, limpa os olhos, desvela a vida.
A Vida...

quarta-feira, 23 de julho de 2025


 Neste livro Orgânico a dois tons, diluem-se matizes várias, vidas e obras que inspiram o parto de cada poema. A vivo vermelho pintam-se livres, ousados e autênticos alguns dos mais fulgurantes e ástricos rostos da poesia feminina. Numa linguagem plural, Sílvia Mota Lopes fala da mudez das coisas, da inquietude da alma, dos labirintos do coração e orienta, através de finos atalhos, o caminho para a autognose. Nosce teipsum! - parece ecoar de Delfos. Para que o poeta se conheça, diz-nos Sílvia em cicio, deve ser capaz de observar-se no silêncio, sentar-se na varanda de pedra, desenredar a máquina de escrever, estar num quarto a sós com a literatura, mas também partilhar com o outro a sua respiração, perfurar, afoito, as muralhas da cidade, ler as entranhas de outras poesias e uni-las em fios comuns. É, enfim, entregando-se ao caudal livre do rio e dos seus afluentes e deixando-se somente ser que o poetas e encontra e que a poesia se faz eco do mundo. São quinquaginta constelações de palavras a erguerem numa outras vozes e que afluem num só propósito: escrever a verdade. Afinal, é um rio que corre nos versos destes poemas.

Luciana Braga
Sobre "Orgânico" livro de poesia novembro ,2024. Poética Edições